O Acidente de Trajeto: conceito e evolução histórica

As maiores preocupações da atualidade, na esfera trabalhista, são com a saúde e a segurança no trabalho. Este tema acaba provocando interesse não apenas aos operadores de direito, bem como aos empregadores, empregados e principalmente aqueles comprometidos em prol da saúde, do trabalho, da previdência e da segurança social.

As preocupações acerca do acidente do trabalho começaram a surgir em maior escala na época da Revolução Industrial. Foi nesta linha do tempo que o número de acidentes do trabalho aumentou em grandes escalas. Isso dadas as condições precárias de trabalho disponibilizadas pelos empregadores na época, somadas às extensas jornadas de trabalho, muitas vezes sem nenhum descanso, além das condições de higiene serem desumanas e praticamente inexistirem equipamentos de proteção individual.

Porém não era apenas dentro da empresa, em horário de jornada laboral dos funcionários, que os acidentes poderiam acontecer. Sabe-se que a rua é um lugar em potencial para acontecer diversos infortúnios, tendo em vista o risco acentuado pelas vias consideradas irregulares, as imprudências no trânsito, os possíveis assaltos, são elementos que tornam as ruas um risco à integridade física e psíquica da pessoa humana.

Nesta realidade surge a espécie de acidente do trabalho, o acidente de trajeto. Como toda novidade, no início, surgiram muitas discussão acerca do tema, porém o seu marco mais significativo na legislação foi com o Dec. Lei n.º 7036, de 10 de Novembro de 1944, onde a espécie de acidente do trabalho foi “batizada” como acidente “in itinere”.

Contudo o seu conceito era considerado limitado, pois, para o legislador, o acidente de trajeto só poderia ser considerado acidente do trabalho quando ocorrido em condução especial fornecida pelo empregador ou se o empregado tivesse que se locomover obrigatoriamente por vias e meios que oferecessem reais perigos, aos quais não estivessem sujeitos o público em geral, ou seja, o conceito era delimitado e o empregador seria responsabilizado apenas nestes casos, caso contrário a obrigação de indenizar pelas perdas e danos eram discutidas no direito comum e não na esfera trabalhista.

As legislações posteriores foram adaptando o conceito de acidente de trajeto, que foi ganhando um contexto mais social e amplo, tendo em vista que além das hipóteses anteriores, agora ele poderia ser reconhecido como acidente do trabalho também nas vertentes de percurso da residência para o trabalho ou vice-versa, bem como no percurso de ida e volta para a refeição no intervalo do trabalho, tendo em vista que o intervalo faz parte da jornada laboral do funcionário, ou seja, é considerado como tempo de trabalho, sendo totalmente aplicável a responsabilidade do empregador em qualquer infortúnio que venha a acontecer.

Destaca-se que além de ter ampliado o conceito, o legislador começou a interligar a essência do acidente de trajeto com o risco profissional, tendo em vista que não importava mais se a condução era fornecida pelo empregador ou se encontrava-se em vias que oferecessem perigos não sujeitos ao público em geral. Assim, a legislação tomou um tom mais coletivo e preocupado com o lado humano.

Outra preocupação do legislador foi com o termo utilizado pelo Decreto n.º 61.784, de 28 de Novembro de 1967, que em seu artigo 6º, §2º, excluiu como hipótese de acidente do trabalho aquele sofrido pelo empregado que tivesse interrompido ou alterado o seu percurso, por interesse pessoal, bem como regulamentava o §3º do mesmo artigo, em que percurso era aquele trajeto que fosse utilizado de forma usual da residência ou do local da refeição para o trabalho.

Neste aspecto, as interpretações foram distintas. Preocupou-se que se o empregado alterasse a sua rota “usual” utilizada para ir até o seu local de serviço, por exemplo, para fugir de um trânsito congestionado ou até mesmo de um acidente de trânsito, seria interpretado como uma alteração do percurso por motivo pessoal. Porém o que se viu é que a interpretação não deveria ser realizada de forma tão literal, tendo em vista que o empregado é livre para escolher o caminho que melhor lhe convir, bem como o final pretendido pelo empregado é o mesmo, ou seja, ele busca chegar até o seu local de trabalho, mesmo que tenha tomado uma rota distinta daquela usualmente utilizada por si. Seria reconhecido o acidente “in itinere” caso o mesmo viesse acontecer.

No âmbito de jurisprudência acerca do tema, não há que se exigir, para a caracterização do acidente de trajeto, o percurso do trajeto e o tempo feito pelo empregado, ou seja, não é um breve desvio na rota que será descaracterizado o nexo entre o evento acidentário e a atividade exercida pelo empregado.

Atualmente o acidente de trajeto encontra-se inserido no Art. 21, IV, alínea d, da Lei n.º 8.213 de 1991, onde é equiparado ao acidente do trabalho e ao contrário da primeira aparição na legislação, seu conceito e sua aplicação tornaram-se mais amplo.

Assim, partindo do pressuposto da evolução histórica que essa espécie de acidente do trabalho teve, têm-se que o acidente de trajeto pode ser definido como aquele fato jurídico que ocorre quando o trabalhador está em seu percurso habitual de trabalho para a sua residência ou vice-versa e venha a acontecer o acidente, vitimando o trabalhador ou lhe causando uma lesão temporária ou parcial que resulte em uma redução de sua capacidade laborativa ou não.

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