Comércio responde por venda de alimento estragado mesmo sem ingestão

É irrelevante para caracterizar os danos material e moral a ingestão de produto impróprio ao consumo adquirido em comércio. Essa conclusão fundamentou o acórdão da 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais da Bahia que negou provimento ao recurso inominado interposto por uma rede atacadista. A decisão confirmou a sentença que condenou a empresa a ressarcir um cliente e ainda a indenizá-lo em R$ 5 mil.

“A responsabilidade objetiva do fornecedor restou configurada, na medida em que comercializou produto impróprio para consumo”, anotou a juíza relatora, Maria Auxiliadora Sobral Leite. Sem qualquer reparo à sentença do juízo da 11ª Vara do Sistema de Juizados Especiais de Salvador, a julgadora considerou que a indenização de R$ 5 mil por dano moral “atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade”.

O acórdão também ratificou a condenação da rede atacadista a devolver ao autor da ação R$ 56,20, valor desembolsado na compra dos produtos impróprios. A relatora decidiu monocraticamente por se tratar de matéria com entendimento sedimentado pelo colegiado ou já com jurisprudência uniformizada, conforme resolução do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) e a permissão do artigo 932 do Código de Processo Civil.

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Tema sumulado

Segundo a relatora, a matéria discutida no recurso já se encontra “sedimentada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça”. Aliás, por esse motivo, a Turma de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais do Poder Judiciário da Bahia, em sessão ordinária ocorrida no último dia 21 de julho, reanalisou o tema e, com base em julgados do STJ, atualizou a Súmula nº 29.

“Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é irrelevante, para fins de caracterização do dano moral, a efetiva ingestão, pelo consumidor, do produto considerado impróprio para o consumo, em virtude da presença de corpo estranho no alimento, pois, invariavelmente, estará presente a potencialidade lesiva decorrente da aquisição do produto contaminado”, diz a nova redação da Súmula 29.

O autor da ação narrou em sua inicial que adquiriu 12 quilos de arroz e um kit de produtos de feijoada em uma unidade da rede. Ele afirma que, no momento do preparo, constatou que os alimentos estavam estragados. Laudo de perícia feita no Laboratório Central de Polícia Técnica concluiu que “as amostras encaminhadas são impróprias ao consumo humano”.

A juíza Maria Auxiliadora Sobral Leite assinalou que a parte autora comprovou ter comprado o arroz e os itens de feijoada no estabelecimento da ré, enquanto perícia solicitada pela Delegacia de Defesa do Consumidor (Decon) e feita em órgão oficial constatou que eles estavam impróprios ao consumo, “não restando dúvidas da potencialidade lesiva dos produtos alimentícios”.

Inquérito arquivado

Sobre os mesmos fatos, a Decon instaurou inquérito policial para a apuração do suposto crime do artigo 7º, inciso IX, da Lei 8.137/1990 (vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria em condições impróprias ao consumo). O delito é punível com detenção de dois a cinco anos ou multa.

A promotora Joseane Suzart Lopes da Silva se manifestou pelo arquivamento do procedimento policial, “diante da não identificação do agente causador da infração penal”, conforme justificou. Porém, a representante do Ministério Público ressalvou que já foram instaurados inquéritos civis para se averiguar as condições sanitárias e de segurança de lojas da rede atacadista e apurar a sua eventual “responsabilidade objetiva”.

A juíza Eduarda de Lima Vidal, da 1ª Vara Criminal Especializada de Salvador, acolheu a promoção de arquivamento do inquérito policial. “Não obstante haver prova de materialidade, a autoria, elemento igualmente necessário para a propositura de eventual ação penal, restou demasiadamente fragilizada. Isso porque não há como comprovar, como bem pontuado, quem é o sujeito ativo do crime em espeque.”

Processo 0135206-02.2022.8.05.0001

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