STJ mantém penhora de bem de família em caso de alienação fiduciária

Maioria dos ministros da 2ª seção observou diferença entre hipoteca e alienação fiduciária, e não conheceu dos embargos.

A 2ª seção do STJ não conheceu de recurso e manteve a penhora de bem de família em alienação fiduciária.

O imóvel pertence e serve de residência aos únicos sócios de uma empresa, e foi oferecido e aceito pelo banco como garantia real em um empréstimo em prol da pessoa jurídica, sem que tenha ocorrido benefício à entidade familiar.

Quando do início do julgamento, o relator, ministro Marco Buzzi, votou por dar provimento aos embargos de divergência, decisão que evitaria a alienação do bem.

Ministro Marco Aurélio Bellizze votou em seguida, divergindo do relator, não conhecendo dos embargos. Ministro Moura Ribeiro acompanhou a divergência.

Proferidos os votos, o relator pediu vista regimental, que foi devolvida na sessão desta quarta-feira, quando Buzzi alterou seu voto, ressalvando seu entendimento pessoal, em respeito a decisões anteriores proferidas pela Corte.

Mudança de voto

Ministro Marco Buzzi observou que, inicialmente, votou por dar provimento aos embargos a fim de reformar acórdão e negar provimento a agravo em REsp interposto pela instituição bancária, aplicando jurisprudência da casa segundo a qual, na hipótese em que asseverada ausência de proveito econômico da entidade familiar, configurar-se ia impenhorável o bem de família objeto da presente controvérsia.

Contudo, diante dos fundamentos da divergência, os quais não conhecem do apelo recursal por ausência de demonstração do alegado dissídio jurisprudencial, e sobretudo em homenagem à coerência das deliberações do STJ, o ministro concluiu impositiva a doção da nova orientação majoritária da 2ª seção.

Buzzi citou dois recentíssimos julgados de hipótese similar: não foram conhecidos embargos no REsp 1.559.370 e no REsp 1.559.348, ambos de relatoria do ministro Moura Ribeiro, publicados em 5 de junho de 2023.

O ministro observou que, “nos referidos julgados, o colegiado entendeu que a divergência viabilizadora dos embargos não se revela configurada quando os acórdãos indicados como paradigma tratam da aplicação da garantia hipotecária”.

Como o eventual acórdão impugnado cuida de matéria atinente à aplicação do instituto da alienação fiduciária, considerou impositiva a rejeição dos embargos de divergência.

“Com efeito, ressalvado o entendimento pessoal deste signatário acerca da temática em debate, à luz destes supracitados julgamentos, não há se falar mais em similitude fática e jurídica, porque os acórdãos paradigmas traduzem compreensão jurídica acerca da incidência ou não da proteção do bem de família, quando há pactuação de garantia hipotecária, circunstância que se diferencia dos efeitos da alienação fiduciária em garantia.”

Foi esta a conclusão adotada pelo colegiado nos processos citados – ficando vencidos Buzzi e Raul Araújo.

Assim, adotando a compreensão, o relator mudou o voto para não conhecer dos presentes embargos de divergência.

Os ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Villas Bôas Cueva acompanharam a nova posição do relator, votando também pelo não conhecimento.

Humberto Martins e Isabel Gallotti não assistiram à sustentação oral, e, portanto, não se manifestaram.

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Divergência

Ministro Raul Araújo, mantendo o posicionamento apresentado nos processos citados, divergiu, adotando o entendimento original do relator.

Para ele, não há diferença entre hipoteca e alienação fiduciária para fins da aplicação da impenhorabilidade do bem de família.

“Não vejo como se possa justificar a distinção entre os institutos da hipoteca e da alienação fiduciária de imóvel para efeito da aplicação da garantia da impenhorabilidade do bem de família, pois essa garantia é instituída pela lei 8.009/90, enquanto a alienação fiduciária não é referida na lei porque não existia. Somente seria instituída em 97, pela lei 9.514. Ambas, tanto alienação fiduciária de imóvel quanto hipoteca, são operações de financiamento imobiliário, e constituem garantia do credor através do imóvel.”

Ele observou que a única hipótese em que se pode excepcionar na regra de impenhorabilidade do bem de família é quando o credor é titular do crédito destinado a construção ou aquisição do próprio imóvel.

No caso, destacou o ministro, o casal adquiriu empréstimo junto ao banco para investir em negócios e não conseguiu pagar; as instâncias ordinárias reconheceram que o empréstimo não fora contraído em benefício da entidade familiar; e o STJ fugiu à aplicação do entendimento de que, no caso de hipoteca, somente quando se comprovar que foi constituída em benefício da entidade familiar é que se pode fugir da regra da impenhorabilidade.

“Teríamos que observar a regra. Qual é a regra? É a impenhorabilidade do bem de família, para que uma família não vá para a rua. Essa família vai para a rua com essa decisão. Eu não posso chancelar, porque, a meu ver, contraria nossos entendimentos salutares em relação a hipoteca. E não há nenhuma distinção desses institutos para os efeitos que estamos considerando.”

Assim, votou por conhecer os embargos de divergência, mas ficou vencido no julgamento.

Leia a matéria original.



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